domingo, 30 de janeiro de 2011

Hoje notei a solidariedade...

Numa determinada época do ano passado fiz uma atividade que consistia na realização de um "ato de solidariedade". Coloco entre aspas pelo simples motivo de que o sentido deste não se restringe ao senso comum. Abarcou em seu contexto tudo aquilo que chamamos simples gestos, desde educação até a ajuda em instituições e prática da caridade.
O objetivo, pelo que entendi como foco da disciplina, era me colocar em contato com coisas que muitos não têm mais tempo para realizar, ou coisas boas e simples que fazemos sem perceber. Arrisco até algo mais "profundo" como me modificar positivamente. Um objetivo nobre, por assim dizer, que não alcançou a todos, claro (notas, ainda são importantes).


Não havia necessidade de realizar algo em um orfanato, mas eu escolhi fazê-lo. E de mãos vazias, para apenas observar, eu fui ao lugar.


Esse texto terá uma descrição que não poderia jamais fazer naquele tempo. Não tinha profundidade psicológica para tal.


Eis que vi exatamente o que esperava, a simplicidade. Num canto, caixas com doações. Não eram coisas de criança, não eram sequer coisas para as crianças. Eram coisas doadas. Existe uma grande diferença entre doar algo para alguém e apenas se livrar disso. Com muito pesar, comparo aquele lugar com um depósito de coisas não mais úteis. Digo isso porque vi numa das caixas uma sandália de salto alto, cor azul brilhante. Não era de alguma criança, e não era para aquelas crianças, era para sobrar espaço no guarda-roupas da dona.
Mais do que isso, as crianças não tinham um sorriso estampado em suas faces quando as vi, elas tinham semblante de estranhamento. Fui falar com uma das coordenadoras, que me contou sobre a violência que sempre ouvimos falar, o motivo que as levou até lá, o que deviam fazer quando elas atingiam certa idade, a adoção, o apadrinhamento.
Saí desse lugar, senhores, silenciosamente. Não, não era eu silenciosa, era minha ação silenciosa, era minha impotência que me calava. Gostaria de fazer mais, de verdade, ali dentro. Mas vou frisar bem: Ali dentro.


Depois de muito cheguei onde queria: É até bonito, mostra-se que tem "um bom coração" e pricípios solidários ao dizer que se compadece dessas crianças, dos mendigos, etc. Mas é, estranhamente, um sentimento passageiro. Podemos sim fazer por elas, se realmente quiséssemos. Mas porque não fazemos? Uma atitude não mudará o mundo, não é? O contrário seria só slogan de marca esportiva. "A vida é de cada um" e "ainda bem que existem pessoas que cuidam delas...". É assim que é possível manter a compaixão e o egoísmo em equilíbrio. Retire seus potenciais atos solidários e jogue para as mãos de outros, como se representasse sua ação perante a desigualdade social.


Eu também sinto a compaixão passageira. Eu sei e digo, poupando hipocrisia para outros momentos, que ao chegar em casa me senti confortável, segura no meu mundo, e até dei mais valor para minhas coisas.


É para isso que elas servem? É para você se sentir melhor com o que você tem, que servem as crianças carentes? É fácil inferir que elas tem sentimentos e sofrem, mas ninguém quer isso, eu não quero isso. E mais, posso afirmar assim pois olho também para cima e vejo aqueles que são mais do que eu. E eles não se compadecem. Eles deveriam, mas não fazem.


Perceba: Existem pessoas que realizam solidariedade. Em geral, nós não o fazemos, não temos tempo ou condições, até mesmo falta vontade. Niguém seria culpado por aprender a ser assim.


Não nascemos materialistas, tornamo-nos materialistas.

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